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O rock que morre velho

"É com imensa tristeza que anunciamos a morte de nosso querido Charlie Watts”, post publicado pela banda The Rolling Stones (Fotos: Instagram @therollingstones)

Vinte e sete anos era a idade limite. Morre-se em qualquer idade, e a qualquer época, e como explicou vô Januário a um neto, em Galiléia, “a única coisa que se precisa para morrer é estar vivo”. Mas, 27 anos parecia ser, por uma incrível coincidência, a idade de morrer dos roqueiros. Brian Jones, do Rolling Stones, inaugurou a maldição em julho de 1969; Jimi Hendrix continuou, em setembro de 1970; 16 dias depois, Janis Joplin, e menos de um ano depois Jim Morrison, do The Doors.

Era estatisticamente e relativamente pouco, mas eram quatro ícones tão representativos, em um período tão curto. Foi o que ficou no imaginário. Maldição, esta dos 27 anos, atenuada porque John Bonham morreu aos 32 anos, em setembro de 1980 – morte incrivelmente devastadora porque representou também o fim do Led Zeppelin. De memória, lembro apenas de outros dois, mais recentes: Kurt Cobain, do Nirvana, em 1994, e Amy Winehouse, em 2011 – uma bluzeira, como Joplin, que entra na lista porque sempre houve esta confusão entre rock e blues (e está aí o Led Zeppelin que não deixa ninguém mentir).

Porém, uma rápida consulta ao Google revela uma lista muito, muito extensa de morte aos 27 anos, embora haja na página grandes distorções: inclui, por exemplo, Evaldo Braga (um cantor brega brasileiro – bons tempos! O Brasil está tão medíocre que sentimos muita saudade do tempo em que a gente era só brega) e até o neto de Elvis Presley, que, creio, nunca foi ninguém além de descendente do Rei do Rock.

Mas, Charlie Watts morreu, na semana passada, aos 80 anos, idade em que Tolstói fugiu de casa  – e foi perdoado, pois não é qualquer um que realiza um desejo de infância aos 80 anos… 

Os Stones (Watts, Mick Jagger, Keith Richards e Ron Wood/Bill Wyman) pareciam eternos, mais até porque, crueldade do destino, a morte de Brian Jones tenha de certa forma preenchido a cota de tragédia da banda. Conta a lenda, da série “loucuras do Rock”,  que quando chegou a notícia, veio incompleta: “um dos stones morreu”. Até que se revelou qual, foi um Deus nos acuda. Quando se confirmou Brian Jones, o empresário suspirou aliviado: “Ainda bem que não foi o Jagger…”.

Contudo, nunca saberemos o que eles fariam a partir do 28° ano de vida. Hendrix já tinha chegado ao auge do controle da guitarra; Joplin talvez perdesse a timidez, que, a rigor, nunca foi empecilho para o seu canto extraordinário; Morrison talvez emprestasse mais uma de suas canções para mais uma trilha sonora de filme – é para todo o sempre inesquecível a abertura de “Apocalypse Now”, de Copolla, ao som de “The End”, e Winehouse certamente chegaria ao nível das grandes divas, como Dinah Washington.

De Charlie Watts basta prestar atenção para saber tudo, de cada pancada que suas baquetas deram na bateria. Os fãs mais entusiasmados dos stones citam “Miss You”, “Start Me Up” e “Under My Thumb” como exemplos máximos de excelência. Mas é  em “Sympathy for the Devil”, de longe a melhor letra de Jagger/Richards (“Por gentileza me permita que eu me apresente/Sou um homem de fortuna e requinte/Estou por aí já faz alguns anos”), que Watts dá a melhor prova de que vale a pena viver além dos 27 anos.

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