
A Empresa Municipal de Pavimentação e Urbanidades (Empav) deverá devolver aos cofres públicos de Juiz de Fora o valor de R$ 1.594.394,66, em razão de superfaturamento identificado em contrato firmado com a Prefeitura para serviços de revitalização de praças, parques e jardins. A recomendação é do Ministério Público de Contas de Minas Gerais (MPC-MG), que também pediu a instauração de tomada de contas especial em todos os contratos da empresa pública com o município, diante de indícios de prejuízo ao erário que pode chegar a R$ 6.081.750,00.
As informações constam no parecer do procurador Daniel de Carvalho Guimarães, elaborado no âmbito de uma auditoria de conformidade conduzida pelo Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), com o objetivo de avaliar a regularidade de contratos de engenharia firmados com dispensa de licitação. Até o momento, apenas um contrato foi analisado. O processo tem como relator o conselheiro Hamilton Coelho.
O Ministério Público de Contas recomenda ainda a aplicação de multas que podem superar a R$ 100 mil ao ex-diretor-presidente da Empav, Richard Tavares de Souza, e ao ex-secretário de Obras, Lincoln Santos Lima, por falhas no planejamento, execução e fiscalização contratual. Atualmente, eles ocupam os cargos de secretário de Mobilidade Urbana e diretor-presidente da Cesama, respectivamente.
Superfaturamento em poda e transporte
O valor superfaturado refere-se, principalmente, à duplicidade na contratação de pessoal para o serviço de poda de grama e à diferença entre os valores cobrados pela Empav para transporte de servidores e os efetivamente pagos às subcontratadas. O contrato analisado, que trata da revitalização de praças, parques e jardins, tem valor global de R$ 10 milhões.
No caso da poda de grama, a inspeção “in loco” verificou que não havia equipe dedicada exclusivamente à limpeza de praças, apesar de esse serviço constar separadamente no orçamento. A atividade era realizada pelos mesmos auxiliares da equipe de poda, já previstos na planilha de custos. A prática gerou um prejuízo estimado de R$ 1.366.357,16.
Quanto ao transporte, a auditoria apontou falhas no modelo de estimativa de horas e recomendou a adoção de controle baseado nas distâncias efetivamente percorridas. A análise comparativa entre os valores pagos pela Prefeitura à Empav e os desembolsos da Empav às subcontratadas revelou um superfaturamento de R$ 228.037,50.
Possível prejuízo de mais de R$ 6 milhões
A auditoria também apurou que a Prefeitura realizou pagamentos indevidos à Empav relativos ao Imposto Sobre Serviços (ISS), do qual a empresa pública é isenta. A inclusão irregular desse tributo no cálculo do BDI (Benefícios e Despesas Indiretas) nos contratos pode ter causado prejuízos superiores a R$ 6 milhões entre 2020 e 2024, período em que foram celebrados contratos que somam R$ 186,03 milhões.
Os gestores da Prefeitura e da Empav admitiram o erro na composição do BDI. Em defesa enviada ao TCE-MG, informaram que a falha foi verificada em contratos firmados entre meados de 2022 e 2024. Nesse intervalo, o valor de ISS pago indevidamente teria sido de R$ 4.936.069,51. Do total, R$ 2.503.510,25 relativos aos contratos de parques e jardins já foram ressarcidos. Ainda resta o reembolso de R$ 2.432.559,26, referentes a contratos de pavimentação.
Apesar das explicações, o Ministério Público de Contas manteve a necessidade de tomada de contas especial “para apurar com exatidão os valores pagos de forma indevida pelo município de Juiz de Fora à empresa pública em decorrência da consideração de parcela referente ao ISS no cálculo do BDI dos contratos celebrados”.
Falhas na fiscalização
A auditoria também apontou fragilidades na fiscalização do contrato. Segundo o relatório, não havia um engenheiro dedicado exclusivamente à supervisão dos serviços. O engenheiro Isaque de Souza Silva, designado como responsável técnico, informou que dividia sua carga horária com outras atividades da Empav.
A fiscalização ocorria apenas de forma documental, sem acompanhamento físico das obras, o que, de acordo com o TCE-MG, dificultou a detecção de irregularidades e possibilitou o pagamento indevido de serviços.
Em resposta, os dirigentes da Empav responderam que a empresa possui em seu quadro de empregados “uma vasta gama de engenheiros civis que acompanham de perto a execução do contrato”. Para comprovar a informação, apresentou documentos que indicam a atuação de três profissionais: Isaque de Souza Silva, Guilherme Pena Neumann e Iury Carvalho Fagundes. No entanto, o TCE-MG constatou que, entre janeiro e outubro de 2024, a empresa não possuía engenheiros civis registrados em seu quadro, conforme o Cadastro de Agentes Públicos (CAPMG).
Além disso, embora Isaque Silva tenha confirmado atuação parcial, não foi apresentada nenhuma comprovação da participação de Guilherme Neumann no contrato. Já Iury Fagundes só se formou em fevereiro de 2024 e teve seu registro profissional emitido em junho, quando o contrato já havia se encerrado. Ele assumiu o cargo de engenheiro somente em janeiro de 2025.
Assim, a alegação de que haveria uma “vasta gama de engenheiros civis” foi, segundo o TCE-MG, apenas parcialmente comprovada.
Subcontratação irregular e desperdício de recursos
O relatório técnico revelou ainda que cerca de 70,31% dos serviços previstos no contrato foram executados por terceiros, contrariando cláusula que veda a subcontratação e a lógica da dispensa de licitação, que pressupõe a execução direta pela empresa contratada.
A Empav admitiu ter subcontratado 10% dos serviços, mas alegou que o restante se trataria de terceirização de mão de obra, sem transferência de responsabilidade. A justificativa não foi acolhida pela unidade técnica, que destacou que a execução de serviços como reforma de alambrados e instalação de playgrounds exigiu subcontratação efetiva.
Essa prática também resultou em desperdício de recursos, já que tanto os pagamentos da Prefeitura à Empav quanto os da Empav às empresas subcontratadas incluíram a cobrança da taxa de BDI. Isso significa que itens como administração central, seguros, garantias, lucros e tributos foram cobrados em duplicidade, configurando medida antieconômica.
Outro lado
O Pharol procurou a Prefeitura de Juiz de Fora e a Empav para comentar os resultados da auditoria e os pedidos de responsabilização dos gestores. Até a publicação desta reportagem, não houve resposta. O espaço permanece aberto para manifestações.