Conjuntura

Impacto financeiro da ‘tarifa zero’ desconsidera subsídio já pago às empresas de ônibus

A estimativa de impacto orçamentário-financeiro do projeto que propõe gratuidade no transporte público municipal deixou de fora os valores atualmente pagos pela Prefeitura de Juiz de Fora a título de subsídio às concessionárias do setor. O documento, encaminhado à Câmara Municipal 48 dias após o início da tramitação da proposta, apresenta apenas os custos relacionados ao deslocamento dos 12.933 servidores da administração direta e indireta, calculados com base na chamada tarifa técnica de R$ 250.

Segundo a projeção, o impacto financeiro da medida para o ano de 2026 seria de R$ 40,8 milhões. Além da exclusão dos subsídios, a repercussão da medida nos contratos de empresas de terceirização de pessoal também não foi incluída na estimativa. Outro ponto de crítica é a ausência de uma declaração do ordenador da despesa sobre a adequação orçamentária e financeira em relação à Lei Orçamentária Anual (LOA), ao Plano Plurianual (PPA) e à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), conforme solicitado pelo presidente da Comissão de Legislação, Justiça e Redação, vereador Pardal (União Brasil).

O custo total do sistema de transporte coletivo na cidade é estimado em R$ 360 milhões anuais. Atualmente, cerca de R$ 120 milhões já são arcados pelo poder público por meio de subsídios, enquanto o restante é garantido pela arrecadação tarifária. É justamente a omissão desses R$ 120 milhões na projeção de impacto que gerou dúvidas sobre a transparência e a precisão da análise financeira do projeto.

No anúncio da proposta de “tarifa zero”, a prefeita Margarida Salomão (PT) defendeu a viabilidade da medida com a manutenção da atual política de subsídio e a criação da chamada Tarifa Técnica Mensal, a ser paga por empresas com dez ou mais empregados, proporcionalmente ao número de postos de trabalho. No entanto, modelos semelhantes em outras cidades, como Belo Horizonte, Paranaguá (PR) e Vargem Grande Paulista (SP), enfrentaram contestações judiciais e até mesmo declarações de inconstitucionalidade das taxas propostas para financiar o transporte gratuito.

Em Juiz de Fora, a proposta chegou a ser apresentada a um grupo restrito de empresários, que seriam os principais financiadores da gratuidade, mas não foi bem recebida. A má receptividade acabou levando ao adiamento das conversas com outros representantes do setor.

O projeto deverá enfrentar forte debate na Câmara Municipal. Além das lacunas persistentes no estudo de impacto financeiro, vereadores já protocolaram pedidos de audiências públicas para discutir a proposta. A demora no andamento pode comprometer o cronograma da nova licitação do transporte coletivo, prevista para este ano, e forçar a prorrogação do contrato vigente com o Consórcio Via JF.

Um estudo encomendado pela Prefeitura à Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) sobre a adoção de um fundo privado para financiar a gratuidade só será concluído em março de 2026. O levantamento visa mensurar os impactos econômicos da medida. No entanto, o cronograma de execução do convênio prevê que o edital da nova licitação do transporte público coletivo seja lançado entre outubro e novembro deste ano, antes da conclusão das avaliações sobre o fundo privado. Essa discrepância levanta dúvidas sobre a base em que a nova licitação será estruturada, especialmente se a gratuidade tarifária for o pilar central do novo modelo.

A Prefeitura não se manifestou sobre o descompasso entre as discussões e o lançamento do edital.