Na virada do século XIX para o século XX, diversos jornais foram publicados em Juiz de Fora. Nenhum deles teve mais importância que O Pharol, uma das “folhas de tradição nas comunidades em que são publicadas, de larga aceitação pela ‘boa sociedade’ local e de forte penetração junto às elites agrárias”, como descreve a professora Hebe Mattos no livro “Das cores do silêncio”.
Foram sete décadas como referência obrigatória para qualquer pessoa ou instituição em Juiz de Fora. Durante boa parte desse período, O Pharol se valeu de sua privilegiada posição para transmitir à elite juiz-forana o entusiasmo pelo progresso e pela modernização. Em suas páginas, por meio de anúncios comerciais e abordagens sobre questões políticas, sociais ou científicas, escreveu-se parte importante da história do município.
“Nenhuma publicação exerceu tamanha influência sobre a mentalidade dos habitantes juiz-foranos, especialmente sobre os membros de sua elite, como O Pharol”, escreve o professor James William Goodwin Jr, autor do livro “Cidades de papel: imprensa, progresso e tradição: Diamantina e Juiz de Fora, MG (1884-1914)” e do artigo “A luz do progresso em Juiz de Fora: o jornal Pharol nas décadas de 1870-1880”.
O enriquecimento municipal decorrente em boa parte do plantio e exportação do café, explica James William, criara o ambiente, iluminado por O Pharol, para o necessário processo de modernização. Qualquer novidade tecnológica revelada por outros países era comunicada à cidade nas páginas do jornal. “Juiz de Fora é apresentada como cidade voltada para o progresso, núcleo urbano em franco desenvolvimento, alvo presente também nos artigos e editoriais concernentes à agricultura.”
Nenhuma publicação exerceu tamanha influência sobre a mentalidade dos habitantes juiz-foranos, especialmente sobre os membros de sua elite, como O Pharol
Contraditoriamente, essa base econômica cafeeira que sustentava a perspectiva modernizante defendida pelo jornal era profundamente identificada com a manutenção da ordem escravista e voltada para a proteção da grande lavoura. Essa modernização, segundo James William, não atinge a maioria dos habitantes e tinha como objetivo, na verdade, “o fortalecimento de uma dominação social, pela demonstração de força e poder das elites locais”.
Como órgão oficial de publicação das atas das sessões da Câmara Municipal de Juiz de Fora, O Pharol se equilibra ora como aparato cultural de sustentação do status quo, ora como fomentador da modernidade. Mas por pouco tempo, como explica James William. Com o fim da escravidão e o advento da República no final da década de 1880, a situação chega ao limite.
Esse rearranjo das forças no cenário político e econômico nacional é determinante para o rompimento da aliança entre as elites políticas de Juiz de Fora e o jornal. Enquanto as primeiras são forçadas a “uma profunda revisão de sua identidade construída ao longo da segunda metade do século XIX”, o outrora “influente Pharol, como que perdido no tempo, (passa) a defender um regime já derrubado pela modernidade que tanto havia propagado”.