Conjuntura

A quantas andam o bolsonarismo e a direita em Juiz de Fora

O deputado federal Charlles Evangelista e os vereadores João Wagner e Sargento Mello (Intervenção sobre fotos: Camila Matheus)

O ex-presidente Lula, talvez hoje a maior dor de cabeça do presidente Jair Bolsonaro, foi quem melhor definiu o bolsonarismo. “Bolsonaro é um cara que fez uma coisa para o Brasil: dar cidadania à extrema direita brasileira, que tinha vergonha de ser extrema direita.” A extrema direita e parte da direita saíram do armário.

Sim, o presidente tirou muita gente do armário, mas não foi a direita ou a extrema direita. “Tirou quem não gostava do que a esquerda estava fazendo. Agora estamos aprendendo a ser direita com o Bolsonaro.” A avaliação é do vereador Sargento Mello Casal (PTB), para quem só se é de direita se estiver com o bolsonarismo.

Charlles: ‘Se Bolsonaro pular no buraco, eles pulam atrás’ (Foto: Câmara dos Deputados)

Cada vez mais próximo do presidente do seu partido, o ex-deputado Roberto Jefferson, o vereador considera o projeto da direita como de construção recente. “Não temos ainda uma ideia pronta de direita. Na verdade, hoje, a direita é a imagem do Bolsonaro.” Até por não ter nada consolidado, ele acha improvável uma nova onda como em 2018 e cobra foco no centro.

O centro ou centrão, como queiram, tornou-se uma espécie de obsessão do bolsonarismo. O deputado federal Charlles Evangelista (PSL), que acompanhou Bolsonaro e seus filhos em 2018 aqui e no Rio de Janeiro, hoje fala para o eleitorado centrista. Quando muito se coloca como de centro-direita.

“Obviamente, a gente sabe que tem um público muito grande de centro-direita, que eu acho que é o público onde eu tenho mais voto”, afirma o parlamentar juiz-forano. Quanto ao bolsonarismo, ele vê o grupo limitado a 15% da população. É a turma que, segundo o deputado, “se Bolsonaro pular no buraco, eles pulam atrás”.

O centro ou o equilíbrio, segundo o vereador João Wagner (PSC), deve ser o ponto de convergência da política. Militar da reserva com 20 anos de carreira, ele vislumbra o atual cenário como de dificuldades para o capitão Bolsonaro e seus representantes. “A onda Bolsonaro não existe mais. Naquela onda teve muitos castelos de areias que hoje não existem mais.”

Com trabalho social e forte inserção no bairro de Lourdes, João Wagner diz conhecer “a positividade e a negatividade de cada lado”. Sem mencionar rótulos de direita ou esquerda e seus extremos, ele se considera um conservador nato, com defesa dos valores ligados à família. Mas avalia “o outro lado” de forma positiva no aspecto do “trabalho social junto às pessoas mais carentes das comunidades”.

E quem faz oposição no município?

Adepto do tal equilíbrio, João Wagner hoje integra a base de apoio da prefeita Margarida Salomão (PT). Para ele, o governo começa com boa avaliação, embora pondere que, sua experiência no Executivo (ele participou das gestões Bruno Siqueira -MDB e Antônio Almas -PSDB) tem ajudado na compreensão do processo. Sua condição de governista, ressalta, não o faz um eleitor de Lula.

No PSL, apenas o vereador Luiz Coelho (Pardal) tem mostrado postura crítica à gestão petista no município. Os deputados Charlles Evangelista e Delegada Sheila mantêm postura para lá de discreta. O posicionamento de ambos em nada lembra os arroubos antipetistas de 2018 e do início da campanha de 2020, quando Sheila concorreu à Prefeitura. A deputada negou o pedido de entrevista de O Pharol por meio de sua assessoria alegando foco no “trabalho e nas pautas estaduais”.

Mello: ‘Como não ser oposição com essas pessoas que acham que Universidade Federal é a Prefeitura de Juiz de Fora’ (Foto: Câmara Municipal)

Mesmo Sargento Mello, que se tornou oposicionista por excelência, alega que buscou uma relação mais amena no início da gestão. “No início eu até tentei um equilíbrio, não ser uma oposição drástica. Mas quando você tem pessoas que acham que o currículo acadêmico se impõe sobre as experiências de vida, aí fica difícil conversar com essas pessoas.”

Pode ser mera coincidência, mas a mudança de postura remete à maior proximidade com Roberto Jefferson. Também pode ser obra do acaso, mas foi a partir daí que a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), sempre no foco do presidente do PTB, passou a ser alvo do vereador. “Como não ser oposição com essas pessoas que acham que Universidade Federal é a Prefeitura de Juiz de Fora. Eles confundem Universidade com Prefeitura, Prefeitura com Universidade. Isso não dá certo. São coisas diferentes.”

Além da questão dos secretários municipais oriundos da UFJF, Sargento Mello anda às voltas com mudanças na fiscalização das atividades urbanas e, principalmente, com a vacinação contra a Covid-19. “Veja o caso da vacina. Está uma bagunça. Por que juntar todos em dois ou três lugares para vacinação? Por que não vacinar no final de semana? Os funcionários precisam descansar. Claro. Vamos à iniciativa privada pedir apoio. Mas não querem, são autossuficientes.”

Mas e o Governo Bolsonaro?

Quanto à gestão do presidente Jair Bolsonaro, o vereador Sargento Mello é bem mais generoso. “As coisas que foram mudando no país, não se acreditava que poderiam ocorrer, com controles maiores internos. Achavam que seria uma boiada solta. Por isso que a equipe do Bolsonaro precisava de nova oportunidade, de mais quatro anos.”

Alegando não acreditar muito nas pesquisas de opinião dos institutos ligados à imprensa, o vereador considera a situação do presidente ainda como boa. “Fico preocupado se fosse outro governo nessa crise, com essa quantidade de dinheiro rolando e a falta de controle financeiro. Como ia ser isso?”, questiona.

E as denúncias de corrupção na compra de vacinas na CPI da Covid? “Achei que ia ser uma CPI séria. Investigação não pode ser feita daquela maneira que está sendo feita lá. Você pode ser favorável a um resultado positivo ou negativo contra alguém, mas você não pode conduzir. Onde tem o desvio (de recursos)? Tem que esperar o final.”

No caso de haver corrupção, Mello reconhece que “tem que punir os responsáveis”, mas já desvincula o presidente de eventuais danos. “Não vi nada que o Bolsonaro tenha feito. Essa parte administrativa, a condução das coisas da ponta, tem o responsável que você colocou lá e ele tem que responder. Será que ele sabia e tomou providência? Eu não estou confiante nessa CPI.”

O problema não passa pela CPI, segundo o vereador, mas pelo trabalho orquestrado da mídia, os interesses do centro em ter um nome próprio e o “sonho da esquerda achando que o Lula ainda é viável”. Nesse contexto, “Bolsonaro pode ter uma queda, sim, porque é uma luta contra o sistema. Se perder, vai ser pau a pau. O Bolsonaro ainda tem muita credibilidade. Pode ter caído, sim, isso é normal para uma pessoa que está sendo atacada.”

João Wagner é mais sucinto. Na sua avaliação, a politização excessiva e a pandemia complicaram a vida do presidente. “Quando o Governo Bolsonaro começa a dar sinais de que as coisas estavam acontecendo veio a pandemia. Mas não é só isso. Há uma parcela de culpa na condução das coisas. Houve a questão da demora na compra da vacina, as trocas excessivas no Ministério da Saúde. Isso dificultou a compreensão do pessoal do centro, que orbita entre um extremo e outro.”

Cenário para Bolsonaro e a direita em 2022

Para os três parlamentares de Juiz de Fora ouvidos por O Pharol, o cenário para o presidente Jair Bolsonaro em 2022 nem de longe lembrará os bons dias de 2018. Na ocasião, Charlles Evangelista, Sargento Mello e João Wagner integravam as fileiras do emergente bolsonarismo. Hoje eles preferem avaliar o processo eleitoral do próximo ano sob a ótica do centro, com apenas alguns lampejos de Bolsonaro.

Apesar da queda de popularidade do presidente da República nas pesquisas, Charlles acredita que o bolsonarismo ganhou força, mas se restringiu à ala mais radical da população. “Eu não acho que perdeu (força). Mas tinha o apoio do centro que não está tendo com tanta frequência agora. Quem conseguir pegar os votos do centro que vai ter sucesso.”

É justamente entre os mais radicais que o deputado espera uma maior disputa nas eleições proporcionais. “Eu acredito que em Juiz de Fora a concorrência mais acirrada será na extrema direita, com alguns candidatos que têm surgido na internet, acho que o Mello é candidato também. Vai dar uma disputa mais forte.” Pessoalmente, ele antecipa que vai buscar votos na centro-direita, onde tem maior identidade.

João Wagner: ‘Reconquistar esse esses partidos agora para a próxima eleição não é uma matéria fácil não’ (Foto: Câmara Municipal)

Mello confirma que pode ser candidato. “O PTB nacional quer fazer uma construção de uma bancada aliada ao Bolsonaro. Os nomes que foram escolhidos na Zona da Mata foram o do presidente estadual deputado Bráulio Brás e o meu nome. É uma construção que precisa de tempo para regionalizar.”

O vereador, no entanto, prega cautela em relação à candidatura. “Estou caminhando. Não sei o que vai dar isso. E se eu chegar lá na frente e descobrir que não tenho nenhuma chance? Vou acabar desconstruindo alguma pessoa que tem condição e que é da nossa linha, da minha região. O pessoal precisa entender que todo mundo que é aliado ao Bolsonaro é amigo. Em 2018, todo mundo dividiu e ninguém se elegeu.”

O mesmo pensamento, segundo Mello, deve servir para os seguidores de Bolsonaro em nível nacional. “Se chegar a eleição, começarmos, o grupo mesmo, a se deteriorar internamente, sem conseguir cooptar pessoas que são do centro, que estão indecisos, nós vamos perder de novo.”

Inesperadamente, ele aponta os partidos de esquerda como exemplo a ser seguido. “O que a gente precisa é aprender fazer política igual a esquerda faz. Eles são inimigos (internamente), mas chegando as eleições, meu amigo, eles juntam todos.”

João Wagner até acha que o processo de ajuntamento da direita e da centro-direita foi iniciado, mas não será tarefa fácil. “O Bolsonaro começou a se desentender com os partidos que estiveram com ele logo nos primórdios de seu Governo. Reconquistar esse esses partidos agora para a próxima eleição não é uma matéria fácil não, mas já tem sinais de que alguns partidos já estão voltando.”

Pelo sim pelo não, o vereador vê no horizonte a viabilidade de uma terceira via. “Há pessoas no cenário nacional colocando seus nomes à disposição e podem fazer a diferença. Apesar de ser um cara de esquerda, o Flávio Dino (PSB) tem feito um bom governo no Maranhão e pode surpreender. O Eduardo Leite (PSDB) na centro-direita tem uma boa gestão (no Governo do Rio Grande do Sul).”