Polytheama

Juiz-forana com trabalhos no teatro, TV e cinema fala da inserção de atrizes negras

O espetáculo “Pá de Cal (Ray-lux)” tem dramaturgia do premiado autor Jô Bilac e direção de Paulo Verlings (Foto: Antonio Fernandes/Fotografia)

Kênia Bárbara é atriz, cantora, compositora, poeta e psicóloga. Sim, psicóloga, formada pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e atualmente estudante da Escola Técnica Estadual de Teatro Martins Penna. Vivendo no Rio de Janeiro há alguns anos, atualmente ela se divide entre os ensaios para o espetáculo “Cão Gelado”, que estreia no dia 20 de janeiro no Teatro Firjan Sesi, e as apresentações de “Pá de Cal”, que faz nova temporada no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) do Rio de Janeiro, após apresentações em Belo Horizonte.

No mês da Consciência Negra, conversamos com a juiz-forana que já integrou o elenco do Grupo Divulgação, dirigido por José Luiz Ribeiro, e que estreou nos palcos cariocas com o espetáculo “Meninos e Meninas”, escrito e dirigido por Afra Gomes e Leandro Goulart. Dentro os seus trabalhos, destaca-se o espetáculo “Yabá, Mulheres Negras”, dirigido por Luiza Loroza, que teve sua temporada interrompida por conta da pandemia da Covid19.

“Yabá, Mulheres Negras” contava a história de 10 mulheres negras que se encontravam em uma encruzilhada e cada personagem tinha características referentes às orixás femininas, que se chamam Yabás. O espetáculo foi idealizado e codirigido por Rodrigo França. “A dramaturgia demonstrava os vários pontos de interseção que toda mulher preta tem, independente de classe social e idade. Mostrava as nossas contradições, fugia do apelo sexual que criaram pra nós e humanizava as mulheres pretas e nossas relações”, conta.

Kênia acredita que, no cenário nacional, existe uma evolução na inserção de atrizes negras no mercado através dos produtos das plataformas de streaming. Ela cita a Wolo TV, canal virtual fundado pelo engenheiro angolano Licínio Januário, como uma forma de suprir a falta de representatividade preta nas TVs brasileiras. “É um streaming preto, focado no público preto, com produções pretas. Mas no geral ainda é muito pouco. Há uma timidez, ou uma resistência mesmo, de colocar corpos pretos e indígenas na TV aberta, ter espaço para contar essas histórias. Se a arte imita a vida real, na realidade brasileira, nós mais de 54% da população. O povo realmente tem uma dívida com o povo preto. Então, não faz sentido a falta de representatividade dessas pessoas”, denuncia.

Na TV, no teatro e no cinema

Após algumas participações, a estreia em uma série de televisão se deu justamente em uma plataforma de streaming. Em 2016, fez parte do elenco da primeira temporada de “3%”, primeira produção nacional da Netflix. Dois anos depois, apresentou “O show do Mickey Mouse”, realizado pela The Walt Disney Company Brasil, e, em 2019, estrelou a série “Stella Models”, no Canal Brasil, mesmo ano em que esteve em cartaz com o espetáculo infantil “A Princesa e o Sapo”, dirigido por Anderson Oliveira, e “Änima”, com direção de Gunnar Borges, também parceiro no longa “Dispersão”, que ainda será lançado. A atriz ainda esteve no elenco de “O Juízo”, filme com roteiro de Fernanda Torres e dirigido por Andrucha Waddington. Em 2021, Kênia fez uma participação na novela “Um lugar ao sol”, de Lícia Manzo, que estreou recentemente na TV Globo. No papel de uma professora, ela contracenou com a atriz Marieta Severo.

Já “Cão Gelado” estreia no início do ano e tem texto de Felipe Isenssee e ficará em cartaz até o dia 6 de fevereiro no Teatro Firjan Sesi, de quinta a domingo. “Este é um texto vencedor do Núcleo de Dramaturgia Firjan Sesi, que é um programa de formação de autores para teatro. O espetáculo tem relação com o realismo fantástico e a poesia. A história acontece em uma ilha que está em guerra e conta a história de duas irmãs. Dá destaque ao matriarcado, à união dessas mulheres, para vencer um inimigo maior”, explica. E “Pá de Cal” volta à cena de quinta a sábado, às 19h, domingo, às 18h, no CCBB do Rio.

A agenda de Kênia Bárbara segue atribulada. É esse o futuro que ela espera para si e para todas as outras atrizes negras. O que ela espera? “Oportunidade e respeito. Como disse a Viola Davis, no discurso que ela fez ao vencer o Emmy de melhor atriz, a única coisa que separa as mulheres negras de qualquer outra pessoa é oportunidade. Você não pode ganhar o Emmy por papeis que não existem. A gente que todos os mercados são racistas. Enquanto a grande maioria branca, que não quer abrir mão do privilégio, a gente consome dos nossos. Existem muitas produções pretas. Existe muita gente preta e indígena produzindo”, conclui.