Depois de uma ampla mobilização pelas ruas centrais de Belo Horizonte na última segunda-feira (21), policiais das forças de segurança do estado decidiram em assembleia paralisar as atividades a partir desta terça-feira (22). A categoria pressiona o governador Romeu Zema (Novo) a conceder recomposição salarial de 24%.
O percentual faz parte de um acordo feito com representantes do Governo de Minas em 2019. Na ocasião, o governador apresentou uma proposta, aprovada pela Assembleia de Minas na forma de projeto de lei, concedendo recomposição escalonada de 13% em 2020, 12% em 2021 e 12% em 2022. No entanto, somente o primeiro reajuste foi pago.
O Pharol conversou com políticos integrantes das forças de segurança do estado e com representatividade junto às categorias sobre a atual situação do movimento. Cabo Junio Amaral, que é deputado federal pelo PSL, considera o movimento necessário para romper com “a indiferença do governador com os trabalhadores da segurança pública”.
“Os profissionais da segurança pública do estado estão exigindo nada mais do que dignidade para trabalhar. Não é nenhum direito a mais, não é aumento de salário. Queremos respeito de um governo que entrou sabendo de suas responsabilidades devido ao caos deixado pelo governo anterior”, explica Junio Amaral.
Também exercendo função parlamentar como deputada estadual pelo PSL, a delegada Sheila Oliveira, avalia como legítimo o pleito da categoria. “Estão lutando por um direito.” Ela revela que, embora a Assembleia de Minas já tenha recebido projetos de recomposição das perdas inflacionárias de outros poderes, não há previsão quanto ao Executivo.
“A Constituição federal garante o direito de recomposição anual das perdas inflacionárias, os demais poderes fazem seus reajustes anualmente, inclusive já chegaram à Assembleia os projetos de recomposição do poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública e enquanto isso os servidores do Executivo não tem uma previsibilidade quanto a essa proposta”, critica Sheila.
A delegada Ione Barbosa, que disputou a Prefeitura de Juiz de Fora em 2020, lamenta a postura do atual governo “de descaso com os servidores do setor de segurança”. Para ela, mesmo sendo sempre apontados como referência nacional na segurança pública, os trabalhadores do setor hoje atuam em condições de crescente precariedade.
“Como delegada de polícia, tenho testemunhado a crescente precarização das condições mínimas e essenciais para que nós, da Polícia Civil, possamos realizar aquilo que é nosso trabalho e nosso dever constitucional e que, para os cidadãos e cidadãs do estado, é um direito fundamental: o resguardo da segurança, da incolumidade física e patrimonial das pessoas”, denuncia Ione.
Sargento Mello, que é vereador pelo PTB, não respondeu ao pedido de avaliação do movimento feito por O Pharol.
Primeiro dia de greve das forças de segurança
As associações de cada categoria ficarão de divulgar recomendações específicas para serem seguidas pelos servidores durante a greve. Nesse primeiro dia, policiais civis, militares, penais, bombeiros militares, agentes socioeducativos e servidores administrativos seguiram orientações diversas.
O Sindicato dos Servidores da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais (Sindpol-MG) informou que os servidores estão operando com um número mínimo equivalente a 30% do seu pessoal. Já a Associação dos Delegados da Polícia Civil de Minas Gerais (Adepol-MG) recomendou atuação conforme “a estrita legalidade”. Com isso, delegados e delegadas não deverão usar recurso particular para nenhum custeio nas unidades ou se valer de itens pessoais para trabalhar, como celular, notebook e tablets. Deslocamentos serão feitos somente com pagamento antecipado da diária.
Mesmo sem redução do quadro de pessoal, os policiais penais realizaram apenas serviços essenciais ou urgentes, de acordo com o Sindicato dos Policiais Penais de Minas Gerais (Sindppen). Nas unidades prisionais, os servidores estão suspendendo os atendimentos jurídicos, o banho de sol dos presos, só serão feitas as escoltas de urgência (hospitalares, atendimento médico de urgência e por determinação judicial). As visitas também estão suspensas.
Nos batalhões de Polícia Militar, o número de policiais foi mantido, e as ocorrências são atendidas normalmente. Já nas delegacias militares, os oficiais estão atendendo uma ocorrência por vez.
Governador cancela agenda na região
Após se reunir com seu secretariado na tarde dessa terça-feira (22) para debater a greve das forças de segurança, o governador Romeu Zema anunciou o cancelamento da visita que faria à região. O secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, Rogério Greco, gravou um vídeo explicando que o encontro serviu para a definição de “agendas prioritárias” a fim de debater a recomposição das forças de segurança.
O governador era esperado na sede do Polo Audiovisual de Cataguases. Ainda no município, ele participaria da inauguração da Usina Fotovoltaica da Energisa. Na sequência, passaria em Leopoldina, onde visitaria órgãos governamentais. Sua agenda não contemplava eventos em Juiz de Fora.
Antes da mobilização das forças de segurança na última segunda-feira (21), o Governo de Minas condicionou a negociação de reajustes de servidores à adesão do Estado ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). A matéria já tramita na Assembleia de Minas, mas encontra resistência. Servidores alegam que, com o regime, os salários terão recomposição de perdas futuras, mas sem correção relativa a anos anteriores.
Forças de segurança são proibidas de fazer greve
As forças de segurança, conforme a legislação vigente, são proibidas de fazer greve. As manifestações podem acontecer, mas sem interrupção do trânsito e sem gerar problemas para os cidadãos. Na mobilização de segunda-feira (21), houve transtornos no trânsito da região central de Belo Horizonte.
Também é proibido durante as manifestações do segmento o porte de armas, para que não seja configurada ameaça à população. Isso também não foi evitado no ato na capital mineira, quando policiais foram vistos portando armas.
Embora a manifestação tenha ocorrido de forma tranquila, o histórico de mobilizações de policiais no estado recomenda cautela. Em 1997, a greve da Polícia Militar terminou com a morte do cabo Valério dos Santos Oliveira, de 36 anos. Ele foi atingido por um tiro quando pedia calma para os colegas durante um dos atos da categoria.
O estopim daquele movimento foi o aumento de 11% dado pelo então governador Eduardo Azeredo (PSDB) para tenentes, capitães, majores, tenentes-coronéis e coronéis, deixando de fora soldados, cabos, sargentos e subtenentes. A greve foi encerrada dias depois, com a oferta de um abono fixo de R$ 200 aos não contemplados com 11%.
O saldo do movimento grevista de 1997 teve ainda 5 mil praças presos, 1.759 indiciados e 182 expulsos. No final do ano passado, 24 anos depois, aqueles com pena de expulsão foram anistiados por meio de uma emenda à Constituição do Estado aprovada pelos deputados estaduais.