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‘A liberação do uso de máscaras passa um sinal de que a pandemia já acabou’

Flexibilização do uso de máscaras foi precoce, segundo pesquisador da UFJF (Foto: Leonardo Costa)

Entre as festas de final de ano até fevereiro, o Brasil vinha sofrendo com um aumento significativo no número de casos confirmados e óbitos por Covid-19. O Carnaval foi cancelado, os cuidados necessários para evitar o contágio pelo novo coronavírus foram reforçados. Ainda assim, quem não havia se contaminado antes dificilmente conseguiu escapar ou, pelo menos, conheceu uma pessoa próxima que estava com sintomas.

Poucas semanas depois, diversas administrações estaduais e municipais começaram a dar um anúncio: o uso de máscaras, principal medida para evitar a contaminação, não seria mais obrigatório ao ar livre. Outros ousaram ir além: na última semana, por exemplo, o governador de São Paulo, João Dória (PSDB), anunciou a flexibilização da medida, inclusive, em ambientes fechados.

Em Juiz de Fora, as máscaras foram liberadas em ambientes abertos, com base no percentual de 85% da população com o esquema vacinal completo.  Em seguida, o Governo de Minas adotou a mesma medida para todo o estado. No caso dos locais fechados, o uso da máscara deve seguir como obrigatório até que, pelo menos, 70% das pessoas com mais de 18 anos estejam vacinadas com a dose de reforço.

Apesar de o cenário parecer positivo, pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), responsáveis pela Plataforma JF Salvando Todos, alertam para uma liberação “precoce” do uso de máscaras. Para eles, a medida poderia ocorrer se fossem levados em consideração outros fatores como nível de transmissão, dose de reforço e cenário da pandemia mundial.

De acordo com o último boletim da Plataforma JF Salvando Todos, a 9ª semana epidemiológica de 2022 (27 de fevereiro a 5 de março) registrou 1.418 novos casos e 10 vidas perdidas em Juiz de Fora, o que representa uma redução de 39,76% no número de casos e de 60% no número de óbitos, comparando com a 8ª semana epidemiológica (20 de fevereiro a 26 de fevereiro). Na 10ª semana (6 a 12 de março), foram registrados 1.242 novos casos e 16 vidas perdidas, gerando uma redução de 12,41% no número de casos e aumento de 60% no índice de mortes em comparação com a semana anterior.

Por outro lado, o nível de transmissão segue elevado na cidade, ponto de preocupação entre os pesquisadores quanto à flexibilização do uso de máscaras. Entre 27 e 12 de março, o Número de Reprodução Efetivo (Rt) estimado para Juiz de Fora esteve igual ou acima de 1 em dois dias, com um pico de 1,32 em 9 de março, conforme informações do boletim. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que, para a pandemia estar controlada, este número deve permanecer abaixo de 1 de forma persistente por duas semanas, o que ainda não foi verificado na cidade.

“Considero que ainda é muito precoce a liberação da obrigatoriedade do uso de máscaras, sobretudo em ambientes fechados. O motivo desta minha consideração é que ainda temos um nível de transmissão muito elevado. Ou seja, muitos registros de casos ainda nessas últimas semanas. Além disso, a cobertura vacinal com três doses ainda está muito baixa. Com a variante Ômicron e, sobretudo, com a sua subvariante BA.2, os resultados de pesquisas vêm indicando cada vez mais a importância do recebimento da dose de reforço”, aponta o professor e pesquisador do Departamento de Estatística do Instituto de Ciências Exatas (ICE), Marcel Vieira.

Conforme o boletim, até 12 de março, mais de 238 mil doses de reforço haviam sido aplicadas em Juiz de Fora, ou seja, 41,35% da população recebeu as três doses da vacina contra a Covid-19. Até 22 de março, o boletim de vacinação da Prefeitura de Juiz de Fora indicava que mais de 250 mil pessoas receberam a dose de reforço.

Além disso, outros fatores que justificam a preocupação com a flexibilização de máscaras estão relacionados a não vacinação de crianças de até 5 anos, bem como o fato de que os óbitos por Covid-19 continuam ocorrendo, especialmente após o “boom” da variante Ômicron. Dessa forma, conforme o pesquisador, as medidas de flexibilização deveriam ser tomadas considerando diversos aspectos envolvendo a pandemia, e não apenas determinados indicadores.

“Eu penso que a liberação do uso de máscaras em alguns municípios do país e em alguns estados, principalmente nos locais fechados, passa um sinal para a população de que a pandemia já acabou. Nós sabemos, pelos números de casos e de vidas perdidas, que a pandemia ainda não acabou. Se passarmos esse sinal para a população, a reação é se cuidar menos, ficar menos atento às medidas de prevenção e, como resultado disso, nós podemos ter novas ondas no futuro,” lamenta Marcel Vieira.

O alerta vem a partir da observação do cenário mundial, considerando que outros países já registram um crescimento de novos casos da subvariante BA.2 da Ômicron. “O que pode acontecer no Brasil é que quando essa subvariante se tornar prevalente, se ela encontrar um ambiente totalmente flexibilizado, sem uso de máscaras, sem distanciamento e sem cuidados da população, ela poderá causar muitos problemas”, explica o pesquisador, que conclui: “Poderá trazer, de novo, um aumento do número de casos, das internações e, consequentemente, também do número de vidas perdidas.”