A vida dos outros

Filha consegue ter paternidade reconhecida somente aos 97 anos

Dona Carmelita na reunião de reconhecimento de paternidade ( Foto: TJMG)

No alto dos seus 97 anos, Carmelita de Santo Antônio Chaves ganhou mais um sobrenome. Desde a última quinta-feira (15), ela passou a assinar Carmelita de Santo Antônio Alves Chaves. O “Alves” que se antepõe ao sobrenome do marido veio do seu pai, o português Accácio José Alves. “Porque primeiro eu fui da família de meu pai” explica dona Carmelita, que atualmente mora em Belo Horizonte.

Mas por que tanto tempo para o sobrenome do pai fazer parte de sua vida? Dona Carmelita e sua irmã gêmea, Carmélia, foram separadas e doadas para dois casais de compadres da mãe biológica. Registrada por uma tia da família adotiva, ela conta que sua certidão de nascimento “foi muito mal feita” porque a tia, analfabeta, não conseguiu indicar quase nenhuma informação sobre as gêmeas.

Diferentemente dos registros de nascimento, em sua certidão original não constava o nome do pai ou outras informações familiares. Nem mesmo sobrenome as gêmeas possuíam. Dona Carmelita só se tornou “Carmelita de Santo Antônio Chaves” por ocasião de seu casamento, quando aproveitou para acrescentar o sobrenome do marido, já falecido.

Motivada pelos netos e sobrinhos, que pretendem tentar a sorte em Portugal, dona Carmelita decidiu ir atrás de suas origens. Em março deste ano, sua família – seis filhos e nove netos – decidiu buscar e confirmar as poucas informações que tinha sobre o nascimento e os parentes remanescentes das gêmeas. Então, a comitiva, como ela se refere, desembarcou em Carrancas, no Campo das Vertentes.

Na cidade de seu pai, dona Carmelita descobriu que tinha outros irmãos e parentes, inclusive o atual prefeito. O temor da rejeição da família biológica foi rapidamente afastado nos primeiros contatos, com o acolhimento dos irmãos ainda vivos e dos sobrinhos, que contaram que já sabiam da existência das gêmeas e sempre tiveram vontade de conhecê-las.

Desde então, iniciaram os trâmites para o reconhecimento legal das duas irmãs. Com ajuda dos irmãos de Carrancas, descobriam que o pai reconheceu a paternidade de Carmelita e Carmélia perante os registros de batismo da igreja de Carrancas. Também um exame particular de DNA, realizado há poucos meses com material genético dos irmãos vivos, confirmou o parentesco. No decorrer do processo, há cerca de dois meses, a irmã gêmea, Carmélia, faleceu.

Na audiência de reconhecimento de paternidade, os cinco irmãos vivos de Carmelita participaram por videoconferência e concordaram que ela também seja reconhecida como filha paterna do português Accácio José Alves.

Como a adoção do sobrenome da família é opcional, a juíza Maria Luíza Rangel Pires, titular da Vara de Registros Públicos e coordenadora do Centro de Reconhecimento de Paternidade, indagou se ela pretendia fazer uma alteração do nome para constar o nome do pai. E assim, ela escolheu o novo formato do nome: Carmelita de Santo Antônio Alves Chaves.