
A proposta de estender a gratuidade a todos os usuários do transporte público coletivo, anunciada nesta semana pela prefeita Margarida Salomão (PT) — a chamada “tarifa zero” — enfrenta como principal entrave a definição sobre quem será responsável por custear o funcionamento do sistema.
O custo anual do sistema de transporte público coletivo em Juiz de Fora é de R$ 360 milhões, conforme informou a própria prefeita ao apresentar a proposta. Desse total, cerca de R$ 120 milhões já são custeados pelo poder público por meio de subsídios às concessionárias. O restante é arrecadado com a cobrança de passagens, atualmente fixadas em R$ 3,75 nas linhas convencionais. Aos domingos e feriados, o transporte é gratuito.
Para viabilizar a gratuidade integral, a prefeita propôs, por meio de um projeto de lei encaminhado à Câmara Municipal, a criação da Tarifa Técnica Mensal, a ser paga por pessoas jurídicas com dez ou mais empregados, proporcionalmente ao número de postos de trabalho registrados. O valor seria calculado com base no custo real da operação do sistema, descontadas outras fontes de custeio, como os subsídios.
Durante a apresentação da proposta aos vereadores, Margarida explicou que o modelo foi desenvolvido em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Como parâmetro inicial, chegou-se ao valor de R$ 250 mensais por trabalhador, a ser cobrado das empresas que se enquadrem nos critérios estabelecidos.
Entre 19 municípios com população superior a 50 mil habitantes que já instituíram ou pretendem instituir a gratuidade no transporte coletivo, a proposta de Juiz de Fora se assemelha apenas à que tramita na Câmara Municipal de Belo Horizonte e às iniciativas já adotadas em Paranaguá (PR) e Vargem Grande Paulista (SP). Em todos esses casos, o custeio envolve a cobrança de pessoas jurídicas que atuam nos respectivos municípios.
Em Belo Horizonte, uma emenda supressiva apresentada pela relatora, vereadora Fernanda Altoé (Novo), retirou do texto a criação da Taxa de Transporte Público, originalmente prevista como uma das fontes de financiamento. Segundo ela, a cobrança viola o Código Tributário Nacional e a Lei de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587/12). “Tal como instituída pelo Projeto de Lei, [a taxa] afronta os princípios da referibilidade e da divisibilidade”, argumentou.
Em Paranaguá, a “tarifa zero” foi instituída por lei específica que criou a Taxa de Mobilidade Urbana como uma das fontes de custeio do benefício. No entanto, a cobrança foi suspensa pela Justiça após contestação do Sindicato dos Operadores Portuários do Paraná e, posteriormente, revogada pelo próprio município.
Situação semelhante ocorreu em Vargem Grande Paulista, onde foi criada uma Taxa de Transporte Público, a ser paga mensalmente por todas as pessoas jurídicas instaladas na cidade. Porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) declarou a medida inconstitucional.
Em Juiz de Fora, a vereadora Roberta Lopes (PL) já sinalizou que apresentará uma emenda supressiva assim que o projeto começar a tramitar, com o objetivo de retirar a criação da Tarifa Técnica Mensal. Segundo ela, a cobrança descaracteriza o conceito jurídico de preço público ao torná-lo compulsório, contrariando o Código Tributário Nacional e jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
A vereadora acrescenta que a Lei de Mobilidade Urbana prevê que o financiamento de eventual déficit tarifário deve ocorrer por meio de receitas extratarifárias, subsídios orçamentários e mecanismos autorizados pelo poder público. “Jamais por meio da imposição compulsória a um segmento específico de empregadores”, afirmou.
Por fim, Roberta sustenta que, tal como apresentado, o texto “usurpa competência legislativa exclusiva da União em matéria trabalhista, ao criar um ônus à revelia da sistemática nacional do vale-transporte”.