Contexto

De onde vem a proximidade de Roberto Jefferson com Juiz de Fora?

Roberto Jefferson foi preso na sexta-feira passada (13), a pedido do ministro do STJ Alexandre Moraes, por suspeita de envolvimento com uma milícia digital que atua contra a democracia (Foto: Carlos Mendonça)

O presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, preso na última sexta-feira (13) pela Polícia Federal por incitar ataques e disseminar desinformação contra o Judiciário, esteve em Juiz de Fora dois dias antes, na quarta-feira, em evento de filiação de pastores evangélicos. No final de março, em live com seu correligionário, vereador Sargento Mello, recomendou a criação de uma milícia local para “dar um pau na Guarda Municipal”.

Embora mais agressivo de uns tempos para cá, Roberto Jefferson e seus despautérios não são novidade para o meio político de Juiz de Fora. Desde quando assumiu o comando e o controle do PTB em 2003, a classe política local, de tempos em tempos, convive sob essa desconfortável sombra.

Antes de ganhar popularidade no interrogatório da CPMI dos Correios, em 2005, quando, ao ser questionado sobre irregularidades e fraudes na estatal, denunciou outro esquema, o mensalão, Roberto Jefferson já era figurinha fácil por aqui. Por suas mãos, o ex-prefeito Alberto Bejani havia se filiado ao PTB para disputar a Prefeitura em 2004.

Roberto Jefferson na CPMI dos Correios (Foto: Marcello Casal Jr./AgBr)

Aliás, foi quando estava para receber o título de cidadão honorário de Juiz de Fora, pelas mãos do ex-vereador Rogério Ghedin, que o presidente do PTB viu seu nome aparecer no esquema dos Correios. Maurício Marinho, funcionário da estatal, ao negociar propina com um suposto empresário, mencionou ter o respaldo do então deputado Roberto Jefferson.

Embora a cidadania honorária não tenha se concretizado, Roberto Jefferson passou de chefe das negociações de propina nos Correios para herói da República ao denunciar que o PT, chefiado por José Dirceu, pagava mesada para deputados aliados votarem com o Governo Lula. No final, o pagamento para aprovar projetos não foi comprovado, apenas os crimes de caixa 2.

Isso porque o PTB, em 2003, com a morte do seu presidente, o empresário e deputado José Carlos Martinez, encontrava-se em aguda crise financeira. Para entrar na coligação do então candidato Lula, Roberto Jefferson, recém-empossado presidente da sigla, pediu ajuda financeira ao PT. Ganhou R$ 4 milhões, que não foram declarados à Justiça.

A condenação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) veio em 2012. Pegou sete anos e 14 dias de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Cumpriu 14 meses da pena em um presídio de Niterói, mas acabou beneficiado por uma decisão do STF em 2015, indo para o regime aberto. Em 2016, uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso o favoreceu com um indulto, que extinguiu a punição.

O aparelhamento como política de alianças

Embora tenha perdido o mandato e os direitos políticos ao confessar ter recebido ilegalmente os R$ 4 milhões do PT — parte desse dinheiro, inclusive, irrigou a campanha de Bejani em 2004 —, Roberto Jefferson não perdeu prestígio em Juiz de Fora. Uma vez eleito, Bejani nomeou, primeiro como subsecretário e depois como secretário, Ricardo Luiz Monteiro Francisco, irmão do dirigente petebista.

Observado pelo ex-vereador Paulo Rogério (à direita), o então prefeito Alberto Bejani dá posse a Ricardo Francisco como secretário de Turismo (Foto: PJF)

Aliás, “aparelhar” as prefeituras aliadas, impondo contratações, notadamente de algum parente, tornou-se marca dos negócios políticos de Roberto Jefferson. Seu outro irmão, Ronaldo Francisco, foi procurador em Paraíba do Sul e em Três Rios. Sua filha, Cristiane Brasil, por muito pouco não se tornou ministra do Trabalho no Governo Michel Temer.

Em Juiz de Fora, apenas Ricardo Francisco foi indicado pelo irmão. E como foi. Depois de ficar na Prefeitura até a renúncia de Bejani em 2008, ele voltaria ao Executivo no final de 2012, na gestão Custódio Mattos. Com a chegada de Bruno Siqueira (MDB) ao poder em 2013, o irmão de Roberto Jefferson deixou o cargo, mas voltou à Prefeitura em 2016, no final do primeiro mandato do emedebista, permanecendo com a reeleição.

Atualmente, os dois irmãos de Roberto Jefferson integram a gestão do governador Wilson Lima (PSC) no Amazonas. Ronaldo Monteiro Francisco é secretário-executivo de Desburocratização da Casa Civil e Ricardo Francisco é nada menos que secretário de Estado das Cidades e Territórios.

Da tropa de choque de Collor a Bolsonaro

O avô e o pai de Roberto Jefferson foram vereadores em Petrópolis pelo PTB, aquele genuíno do trabalhismo de Getúlio Vargas e depois de Clodesmidt Riani. Ele, no entanto, ingressou na política pela ala jovem do MDB, em oposição ao regime militar, em 1971. Em 1979, já formado em Direito, filiou-se por um breve período ao PP e depois migrou para o novo PTB.

Com a bandeira do trabalhismo tendo migrado com Leonel Brizola para o PDT, Roberto Jefferson fez do novo PTB uma legenda governista por excelência. Para isso, valeu-se sempre das suas performáticas aparições na TV, herança de suas participações nos programas Aqui e agora, da TV Tupi, e O povo na TV, da TVS.

Roberto Jefferson foi deputado de 1983 a 2005 (quando teve o mandato cassado). Elegeu-se pela primeira vez deputado federal em 1982 com 84 mil votos, o mais votado na legenda. Esteve com Sarney e destacou-se na “tropa de choque” de sustentação de Fernando Collor, de quem foi o principal defensor tanto no plenário, quanto nos meios de comunicação.

O presidente Jair Bolsonaro recebeu Roberto Jefferson no último dia 3 de agosto no Palácio do Planalto (Foto: reprodução)

Na base aliada de Itamar Franco, foi incluído na CPI do Orçamento com seu nome na lista dos 37 deputados que cometiam fraudes no orçamento da União junto a prefeitos e empreiteiras responsáveis por obras em todo o país. Roberto Jefferson acabou absolvido no início do processo, que terminou com 18 deputados cassados.

Governista mais uma vez, agora com Fernando Henrique Cardoso, foi relator de um projeto de lei que regulamentava o uso de armas. Defendeu tipificar como crime, e não contravenção, o uso ilegal e o contrabando de armas de fogo. Na época, bem diferente do que propaga hoje, chegou a dar declarações a favor do desarmamento.

Até 2005, com o desenrolar do mensalão, esteve com o Governo Lula. Tão logo foi cassado, teve sua aposentadoria da Câmara dos Deputados publicada no Diário Oficial. Atualmente ganha, ao menos, R$ 46 mil com o benefício e uma espécie de salário do PTB.

Com seu retorno à presidência do PTB, em 2016, após deixar o presídio, trabalhou a favor do impeachment de Dilma Rousseff, assegurando o apoio do partido ao Governo de Michel Temer. A aproximação com o Governo Bolsonaro foi só questão de tempo. Depois de posar com armas e produzir uma infinidade de despautérios, a união foi formalizada, com o presidente se rendendo de vez ao centrão.

Mas, enfim, por que tão próximo de Juiz de Fora?

Mesmo com domicílio eleitoral no Rio de Janeiro, Roberto Jefferson manteve Juiz de Fora, até pela proximidade, sempre em sua rota. Apaixonado por motocicletas da marca Harley-Davidson, sempre buscou o interior de Minas Gerais para seus passeios. Em um evento na histórica Tiradentes, no auge da fama do mensalão, foi tratado por lá como o “malvado favorito”.

Mas foi somente após assumir o comando nacional do PTB, em 2003, e se aproximar de Alberto Bejani, que Roberto Jefferson começou a fazer de sua influência em Juiz de Fora uma estratégica política nacional. Foi também nessa época que começou a se relacionar com sua atual esposa, Ana Lucia Novaes, da vizinha Comendador Levy Gasparian, onde construiria uma casa.

Reprodução do perfil do vereador Sargento Mello no Instagram

Preso duas vezes pela Polícia Federal, durante a operação Pasárgada, acusado de desvio de recursos repassados pela União, Bejani renunciou e deixou o PTB em 2008. Mesmo tendo indicado o irmão Ricardo Francisco para as gestões Custódio Mattos e Bruno Siqueira, Roberto Jefferson só voltou pessoalmente a fazer política em Juiz de Fora com o vereador Sargento Mello.

Com Ricardo Francisco no Governo do Amazonas, coube ao próprio Roberto Jefferson a condução das conversas em Juiz de Fora. Para isso, conta, além de Mello, com o ex-diretor-presidente da Emcasa, pastor Luiz Cláudio Gamonal. Foram os dois que estiveram com o presidente do partido antes de sua prisão.

Em suas redes sociais, Mello prestou solidariedade ao correligionário. “Mais uma prisão arbitrária no Brasil, que vive a ditadura da toga. Um Supremo covarde que quer calar os críticos a todo custo. Prendem por ouvir o que não querem, mas soltam bandido condenado.”

Lembrando que Roberto Jefferson foi preso na sexta-feira (13) e continua preso após audiência de custódia, após decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, por ter realizado ameaças e ataques aos ministros da Corte e às instituições democráticas.