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Setembro amarelo, alerta vermelho

(Foto: Maxwell Nelson/Unsplash)

Tantas as cores do mundo e o mês do suicídio foi ficar amarelo. Por quê? Cor do sol? Do sinal do meio antes de chegar ao alerta? Cor da esperança? Não, porra, a esperança é verde e usa óculos, tá na música do Zé Rodrix. Então, por que amarelo!?

Em 1994, quando o Brasil foi tetra no futebol e o Senna morreu na pista, um cara de 17 anos se matou nos Estados Unidos. Muita gente se matou nesse ano e em tantos anos antes e depois, mas esse menino, Mike Emme, tinha acabado de restaurar um Mustang 68 (se nunca viu um, assista o filme Gran Torino, do Clint Eastwood, e vai entender a importância que o carro tem). Restaurou e pintou o carro de amarelo.

No velório, amigos levaram cartões e fitas amarelas, com destaque pro chamado: se precisar, peça ajuda.

Caramba, tem muito jeito de pedir ajuda. E tem muito jeito de oferecer! Antes de julgar quem pensa em suicídio, pense se você estendeu a mão. Tem gente que quer gritar, mas não sabe pra quem. E o mundo prega peças.

Tem peça antiga, quase teatral, porque o autor é o mesmo de Fausto. O Complexo de Werther nasceu com um livro do Goethe e tem esse nome porque muita gente se matou porque “era moda” (um jeito escroto de chamar o espírito macabro do tempo). Depois isso aconteceu em vários momentos da história, seguindo artistas, filmes, notícias.

Ah, notícias: por que jornais não falam de suicídio? Porque é, segundo algumas interpretações, antiético. Interpretação covarde ou sem preparação do Código de Ética  da Federação Nacional dos Jornalistas.

Por um lado, no artigo 11, costumam destacar que o jornalista não pode divulgar informações II – de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes. Por outro, o jornalista, conforme o artigo seguinte, deve II – buscar provas que fundamentem as informações de interesse público; III – tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar. No equilíbrio, onde fica a função de prestação de serviço do jornalista? Vai amarelar?

Quem leu a Eliane Brum na revista Época em 2008, na reportagem Suicídio.com, sobre o menino Yoñlu, sabe que é possível fazer jornalismo e política social sem… medo? (Confesso que tô num cagaço pra escrever cada frase, assunto delicado, mas necessário; tiro o chapéu pro que a Eliane Brum consegue fazer com o jornalismo). Precisamos falar sobre suicídio, e isso vai além da mídia oficial.

A reportagem conta, em tempos de Orkut na crista da onda, que os pedidos de ajuda podem não ser gritados. Tantas redes sociais disponíveis parecendo vida real e as pessoas acreditam nelas: ninguém te elogiou, ninguém falou com você hoje, seu post não teve zilhões de curtidas? Claro que  é motivo pra cortar os pulsos. Só! Que! Não!

Se na sociedade do olho no olho as pessoas usam máscaras pra se adaptar aos ambientes, imagine onde nem precisam de máscaras. Sua vida na rede social dialoga com a vida real, estabeleça um limite. Pablo Villaça, melhor crítico de cinema no Brasil (mas ele é mesmo!), faz isso muito bem. Desde uns anos, deixou clara sua depressão no Twitter e isso ajudou muita gente. Ele tem que lidar com imbecis que falam merda, claro, mas bloqueia ou processa (parece simples, mas antes tem que ler, tem que ser forte) e conta pra todo mundo o que fez.

Sabe aquela parte do “peça ajuda”? Pois é assim, contar pra todo mundo. Ele presta um serviço e se ajuda. Contar é importante e contar em larga escala. Alguém, perto ou longe, vai te ouvir. A depressão vem chegando de mansinho, não espere um abraço apertado, ele demora.

Aliás, se espera que tudo aconteça rápido, isso é ansiedade, porta aberta pra novos problemas. Respire fundo, pense que tudo pode demorar um pouco mais e que a vida pode ser melhor se você aproveitar cada minuto. E esse texto tá com cara de autoajuda (mas espero que funcione).

Tem professor que não aguenta mais dar aula pra tela preta, pra aluno com pai junto, pra lista de gente mais que pra gente de verdade e tá fazendo tratamento. Terapia, remédio, curso de constelação familiar, vale tudo. Tá foda pra todo mundo. A saída vai chegar, vamos trabalhar por ela.

O negócio é ter projeto de vida, gente pra abraçar (mesmo que pelo WhatsApp) e saber que você pode sempre estender a mão pra alguém. E o ano inteiro, não apenas em setembro.

Se a situação apertar, ligue pro CVV (Centro de Valorização da Vida). 188. Grátis no Brasil todo.

E quando você, jornalista, tiver dúvidas sobre o que escrever, pode procurar algum profissional da saúde mental pra te ajudar. (Só publiquei este texto porque consultei a Daniele Rangel, psicóloga e coordenadora do curso de Psicologia da Faculdade Machado Sobrinho.)