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Xófem, vote!

Democracia (2011), de Yona Friedman (Foto: Levi Fanon)

2022 tem plebiscito. É eleição entre democracia e o resto. O candidato eleito vai mostrar se o Brasil quer ser uma democracia de verdade, com chance de amadurecer, ou se quer ser o resto.

O Brasil tá nessa de resto desde 2016.

Outro dia teve uma final da Fórmula 1. É campeonato de pontos corridos, nem sempre tem finais nas mais de 70 temporadas. Este ano teve e foi das melhores, tudo na pista, no braço, com a parca vantagem de vitória pro Verstappen se desse empate. Empate = dois fora.

Corrida foi boa, com Hamilton largando na frente e cuidando pra manter a hegemonia que tem desde que a Mercedes resolveu chamar o Schumacher e o Lauda pra fazerem o melhor carro. O único que atrapalhou o Hamilton foi o companheiro dele, Rosberg, mas tava tudo em casa.

Nos intervalos antes e depois da corrida, na Band, aparecerem comerciais da Justiça Eleitoral, entre eles um sobre a importância do voto jovem. Seria estranho ver um anúncio desses, mas tá mesmo precisando. A juventude tá apática, mais preocupada com o Fortnite que com o mundo.

Será que acabou o mundo em que as crianças se preocupavam com o primeiro beijo, o primeiro namoro, o primeiro Gradiente e o primeiro voto? Caramba, votar é fazer parte da vida política. E ter que votar não é uma imposição ditatorial, é uma necessidade pedagógica.

Quem disse isso foi o Paulo Roberto Figueira Leal numa palestra. Quando indagado sobre o voto facultativo de outros países, disse que no Brasil a democracia ainda era jovem (e disse isso bem antes do golpe), por isso a educação política era necessária e o voto é uma dessas ferramentas. Votar é ser político. E votar sempre, pensar no voto, discutir o voto é aprender a votar.

Somente apertar o confirma não sintetiza o poder do voto.

Tá cheio de velho votando porque sabe o que foi viver mais de duas décadas sem poder fazer isso. Sabe o estrago que foi. Tudo bem, votar também pode gerar estrago, mas pelo menos tem opção.

Quando a juventude não quer votar a situação é grave. Muito grave. É entender que aceitam o que vier. A apatia é tão grave quanto a ignorância.

Imagina se o Verstappen, depois de ter largado mal, deixa o Hamilton correr enquanto vai pros boxes lamentar? Ele seguiu, correu, contou com o companheiro de equipe (Checo fez o melhor momento da corrida), comentou, criticou e acelerou quando podia. Levou o caneco pra casa.

O Brasil tá num desmonte constante e é justamente quem vai viver o futuro que vai receber os resultados.

A Margaret Atwood escreveu O conto da aia, cuja série a maioria deve ter visto. Os livros (tem Os testamentos também) são bons e fazem da reflexão necessária. Outro dia, na Flip, ela comentou que, se tivéssemos começado a nos preocupar com as questões ambientais no final do século XIX (sim, mais de cem anos atrás), não teríamos o gargalo climático de hoje. Só que fomos sempre imediatistas.

Se o jovem que pode votar hoje não quer votar, ele (sobretudo ela) deve dar uma olhada no mundo de Gilead, escrito por Atwood. Quando e como um universo daqueles se forma? De repente, num golpe? Não, mas pode partir de um e crescer aos poucos, com pequenos comentários cotidianos, silêncios, omissões e apatias. E ignorâncias.

Com 16 anos a criança já estudou História, conhece Geografia Política e sabe de tanta coisa que ter uma consciência para votar não é tão difícil. Se pra cada notícia esse estudante buscar duas fontes com opiniões diferentes (pode fazer isso só uma vez por dia, ou por semana, já vale), consegue participar de um debate.

Sugestão: escolha um assunto e leia sobre ele durante um mês, um pouco por dia. Vai virar PhD do assunto na escola.

E se achou ofensivo te chamarem de criança com 16 anos, aprenda a argumentar, ou vai ficar nisso mesmo, como tem sido a democracia no Brasil.