Viver de Brasil tem se tornado cansativo. Tanto pelo dia a dia quanto por pensar se esse cotidiano é a tragédia ou a farsa, porque nada é novo.
Veja o caso do supermercado. Poucos anos atrás era possível pensar no almoço do final de semana e fazer as compras na véspera ou no sábado de manhã. Na feira dos orgânicos, movimento crescente de cuidado com a saúde, ou na vendinha perto de casa. Um pouco mais cara, mas cômoda. O brasileiro já vinha se acostumando com isso.
No supermercado, a dúvida era se o Leite Moça ia caber no orçamento da semana. Se não, vamos de Piracanjuba mesmo. Agora, brigadeiro é luxo de aniversário. Se tiver bolo de cenoura pode contar que tem espumante também, coisa de gente fina.
Compra de mês tem voltado à tona, carrinhos cheios na semana do pagamento pra aproveitar os preços. Em breve serão retomadas as posições de largada nas portas dos supermercados na hora da abertura e a correria pelos (por isso assim chamados) corredores pra se chegar ao produto antes da maquininha de colar etiqueta.
Isto é: se tiver maquininha. Antes, ver o funcionário agachado com uma maquininha no corredor era alerta. Mesmo sem precisar do extrato de tomate, se o moço ainda marcava a primeira metade dos produtos, era uma conquista pegar o último, ainda com o preço mais baixo. Uma sábia economia. Hoje o sujeito que reajusta o preço passa rápido, troca a plaquinha e cai fora pra não apanhar.
Nesse esforço todo, economiza-se também com a academia de ginástica. Que fica obsoleta. No Renascimento, as musas eram as gordinhas porque a comida era escassa. As tecnologias de plantio se desenvolveram por todo o globo planificado e passou-se a comer mais e melhor. Kate Moss virou destaque no mundo que dava mais opções. Agora que o brasileiro está comendo menos frango, vai poder se orgulhar quem conseguir manter uns quilinhos a mais.
Coitada da onça. Deu com os burros n’água (ou com a capivara) quando resolveu fazer churrasco no mundo da escassez e do politicamente correto. Não vai mais pro BBB do famosos, foi cancelada.
Se esse estado de calamidade que se constrói deu as caras com o golpe de 2016, de 2019 pra cá foi escolha do povo. O alerta de que seria assim foi dado, mas as urnas mostraram que era melhor seguir o obituário que a Folha não publicou por engano, como fez com o da rainha inglesa. Nenhum dos outros ditos grandes veículos de comunicação fez esse tipo de publicação. O consolo é que muitos deles estão reduzindo a circulação, porque papel tá caro.
Tudo fica caro quando precisa de gasolina. Mais um motivo pras academias de ginástica se preocuparem. O problema das distensões musculares vai pros acidentes de trânsito, porque pouco se respeitam as bicicletas, melhor custo-benefício pro trabalhador e pro planeta. Só não rola um cochilinho ou uma leitura no caminho pro trabalho. No final do dia o sujeito acaba mais pregado do que Jesus Cristo.
Nesse estado de cansaço, o que vale mesmo é um dia de folga. O comércio até reclama, ainda precisa se recuperar das perdas pandêmicas, mas o trabalhador que pode curtir uma sexta-feira santa em casa nem precisa ser cristão pra agradecer. Fosse Cristo vivo hoje, seria morto mais vezes. Nem tanto por suas pregações comunistas. Seria morto pra ter mais feriados no calendário. O Brasil cansa, mas Jesus salva.