Conjuntura

Engenheiro é condenado por postar fake news sobre ajuda a Adélio no dia da facada

O juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau, da 27ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, condenou o engenheiro carioca Renato Henrique Scheidemantel por publicar uma fake news apontando a bancária juiz-forana Lívia Gomes Terra como “a mulher que entregou a faca” para Adélio Bispo.

O autor da facada contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a campanha eleitoral de 2018 em Juiz de Fora agiu sozinho, conforme inquérito da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. A acusação da postagem não foi considerada em nenhuma linha de investigação.

O engenheiro postou no Facebook , logo após o episódio da facada no dia 6 de setembro de 2018, uma imagem do perfil da bancária nas redes sociais com os dizeres “A mulher que entregou a faca para o assassino do 😎 (emoji do rosto com óculos escuro, usado por quem considera Bolsonaro um ‘mito’). Trabalha no Sintraf (Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Financeiro) Juiz de Fora”.

Dois dias após a publicação, Lívia Terra foi alertada de que, nas redes sociais, seu nome estava sendo associado como a mulher que havia passado a faca para Adélio. A partir daquele momento, ela começou a sofrer uma série de ameaças e agressões, com a reprodução em massa da postagem original.

“Tal postagem acabou por gerar uma enorme repercussão, milhares de compartilhamentos e dezenas de outras similares. Muitos, ao invés de pesquisarem e constatarem que aquela postagem era uma mentira, gastaram seu tempo pesquisando sobre minha vida e produzindo textos com todas as minhas informações”.

A bancária conta que, na semana do episódio da facada, ela estava afastada do trabalho por problemas de saúde. “Estava em casa e não acompanhei nada do que estava acontecendo. Lembro-me que, na noite do dia 6, minha mãe ligou para saber como eu estava. Aí ela me disse que o Bolsonaro tinha sido esfaqueado em Juiz de Fora.”

Sem poder sair de casa por conta das constantes ameaças, ela procurou ajuda dos advogados do Sintraf e de um familiar para registrar ocorrência na Polícia Federal. Em seguida, fez o mesmo na Polícia Militar. Ainda assim, manteve uma rotina de medo, com limitações para se locomover até o trabalho ou ao mercado.

“Por anos fiquei com dificuldade em sair da minha casa, único lugar que me sentia totalmente segura. Eu só conseguia sair para trabalhar, mesmo assim depois de passar por crises horrorosas de pânico: tremores, taquicardia, ânsia de vômito, aperto no peito, falta de ar, choro descontrolado. Inúmeras vezes tive que parar no meio do caminho descer do veículo que me encontrava e só conseguia prosseguir depois de vomitar ou passar muitos minutos andando de um lado para o outro”.

Lívia Terra contou que um dia estava em uma farmácia com sua mãe quando um homem começou a filmá-la. O instinto materno acabou fazendo sua mãe repreender o desconhecido, o que não o impediu de partir para agressões verbais. “São quase quatro anos da minha vida vivendo um verdadeiro terror! Alterno fases críticas com fases mais leves, mas o adoecimento ainda está aqui e, vez em sempre, me assombra”. 

Pela acusação de calúnia, o engenheiro foi condenado a uma pena de 10 meses e 20 dias de detenção, que será revertida em restrição de direitos, como o de votar e ser votado, e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas. Ele pode recorrer da decisão. O Pharol tentou contato com Renato Henrique Scheidemantel por email e telefone, mas não obteve retorno.

A condenação considerada branda se deve ao fato de o crime ter sido praticado antes do advento da lei 13.964/19, conhecida como lei do “pacote anticrime”, sancionada em 24 de dezembro de 2019, que entrou em vigor em 23 de janeiro de 2020. Com a nova lei, que alterou diversos dispositivos do Código Penal e do Código de Processo Penal, o crime praticado na rede mundial de computadores passou a ter pena mínima de 1 ano e 6 meses a 5 anos, além de multa.

Mesmo com a pena branda, a condenação do autor da postagem da fake news trouxe alento para Lívia Terra. “Esse é o início do fim de tanto sofrimento. É o ponto final de um processo muito, muito dolorido. Daqui a pouco, tenho certeza, que a Lívia que existia antes daquele fatídico 2018 irá reaparecer totalmente.”