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Quem mora no Castelo Alto?

Parece que quem ganhou as última eleições foi o Camilo Santana. Concorriam alguns para pior ministro do governo Lula. Ele ganhou porque não ficou sentado esperando: fez campanha ao dizer que ficaria sentado esperando o (dito) Novo Ensino Médio dar certo.

Aos olhares de alguns, Fernando Haddad era forte concorrente com o plano econômico e até o Flávio Dino chamou e depois deschamou uma bolsonarista para um cargo de confiança. Campanha dura em alguns momentos. Ciente do resultado, Lula interferiu e suspendeu o Novo Ensino Médio. Sem suspender a Lei da Gravidade, o que sobe, desce. Enquanto não revoga, cabe uma reflexão sobre a existência desse trem e do que permitiu ao trem existir.

Falar trem é comum prum mineiro, por isso um quase mineiro usa de vez em quando, um quase mineiro quase presidente, que numa história do Philip K. Dick poderia ter sido.

O escritor americano é autor de O homem do Castelo Alto, publicado em 1962 e transformado em série pela Amazon recentemente. O romance é ambientado numa década de 1960 em que os Estados Unidos se dividem entre governados por japoneses (Costa Oeste) e por alemães (Costa Leste), países vencedores da Segunda Guerra Mundial depois do assassinato de Franklin D.  Roosevelt.

Entre as áreas existe uma zona neutra, onde um escritor, que mora no dito Castelo Alto, escreveu um livro em que os Estados Unidos venceram a guerra. O livro é o grande tesouro a ser buscado nessa ambientação pautada pelo I Ching, que inclusive apontou para o autor caminhos narrativos durante a escrita dessa acronia (romance ambientando num presente diferente daquele do leitor).

Um escritor brasileiro, orientado pelos búzios, talvez levasse Aécio Neves ao Palácio do Planalto em 2014. Ele até ganhou por uns instantes, como Felipe Massa em 2008 no circuito de Interlagos, mas depois a contagem cresceu para o outro lado.

O discurso do retrocesso era uma das pautas da esquerda, no tempo em que PSDB era considerado direita, embora já moribundo. Voltar ao partido do FHC depois de tanto tempo de Lula e Dilma? Deu certo, ou pelo menos o empurrãozinho para o PT seguir no poder, mas na narrativa dos búzios Aécio recebeu a faixa de Dilma, que, claro, foi lá entregar.

Foram quatro anos sem golpe, sem impeachment, com o que a esquerda sabe fazer de melhor (oposição, treinada desde a invasão dos portugueses em 1500) e o que a direita também aprimora desde então: exportação, no caso contemporâneo, de empresas nacionais. Programas sociais, embora mantidos, perderam investimentos para grandes grupos privatistas, a violência e a educação seguiram caminhos opostos (como já haviam feito nos gráficos de Minas Gerais) e o agro ficou pop.

Os debates políticos se agigantavam em canais de comunicação, expandiam-se pela internet, transformavam-se em memes, em brigas de família e em conversas de fila de supermercado. Sem danos aos almoços de domingo, exceto no segundo semestre de 2018, quando o candidato à reeleição se viu tendo aula com o professor Fernando Haddad, vencedor no segundo turno. Ninguém precisou sair do armário da violência gratuita e da estupidez anticientífica para que a eleição ocorresse.

O autor, orientado pelos búzios jogados pelo agente literário, narrou somente os primeiros dois anos do novo governo, prometendo a parte 2 para breve. As livrarias não precisam reclamar, antes será lançado livro de outro autor, orientado pelas cartas, mostrando a vitória de Eduardo Campos nas eleições de 2014 (pesquisas informais da realidade fora dos livros mostravam, na semana em que o avião caiu, que o candidato tinha 83% das intenções de voto).

De tudo, o mais importante é a certeza de que quem escreve a narrativa brasileira tem o Nobel de Literatura garantido, é questão de tempo.