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A viuvada do Twitter

Tá cheio de viúves no Twitter, embora muites deles não aceitem ser chamades assim. Viúvo ok. Viúva ok. Ideologia de gênero, nem pensar. É assim que esse pessoal chama.

A narrativa, no entanto, é conhecida. Choram o resultado do processo: o fim. Acabou o governo, acabou a mamata, acabou a idoneidade da família, a primazia da pátria, a liberdade de expressão e, nesse novo governo comunista do PT, acabou Deus.

O pessoal chora, lamenta, arremata seguidores, angaria fundos com anúncios, patrocínios, apoios de empresas e segue no discurso do luto, repetindo a saudade de quando tudo era bom, era honesto, era perfeito e todas as juras de amor que cabem em um violão.

Muita gente se solidariza ou critica, lamenta ou questiona, mas repassa as mensagens e segue o discurso, que nesse front não tem nada de novo. Muda o canal, mas a comunicação é a mesma: são as famosas mentiras repetidas cem vezes para se transformarem em verdades.

Só que a fala é forte, concisa, intensa, emotiva e bate na porta de um e de outro que não chegaram a virar as costas para essa falácia, mas ficaram de ladinho. Do pé de ouvido, escutam uma frase que faz sentido, mesmo fora de contexto, e se tornam solidários. Assim, os viúvos arregimentam mais seguidores, associados, interlocutores. E segue circulando dinheiro.

Quando um viúvo usa o luto para se aproximar de outra pessoa, ela remói a culpa: tadinho, tão vazio. Sim, vazio, mas a pessoa caiu, pelo menos tropeçou na corda, que vai sendo esticada até ser transformada em rede.

Na sociedade em rede, a pergunta que Manuel Castells faz é essencial: as pessoas do mundo real são as mesmas que frequentam suas redes digitais? Indo além: a realidade real é a mesma da virtual?

O choro enviuvado que corre pelas redes às vezes faz o leitor se esquecer de olhar para fora delas. De olhar para o que o tempo e as relações sociais construíram ou destruíram com as mesmas estratégias de propaganda.

Quando se está arrasado, existe a busca por quem seja capaz de ajudar a reerguer. Uma pessoa ou um país. Entender que tipo de ajuda é necessária vira segundo plano quando a persuasão modela a argumentação.

O que mais importa entender disso tudo é que os viúvos não são viúvos: são cúmplices. Inclusive a Viúva Porcina.

Bolsonaro e seu discurso de ultradireita não morreram e precisam ser julgados pelo que foi feito no Brasil.

Muita gente morreu nesse casamento. A reflexão e a memória podem impedir que outros cônges desse nível surjam pelo país.