Vem aquele motorista pela pista livre e lá na frente dá seta para entrar onde todo mundo anda devagar. Esperto, furou a fila, haha, chegou na frente e deixou um monte de manés lá atrás esperando o sinal abrir e fechar mais umas dez vezes. Esse mesmo espertão vai sair de casa um dia e ninguém vai dar passagem para ele. Não por ser ele, mas porque o tempo ensinou que quem dá passagem é mané. O tempo e o espertão que vai chegar atrasado no trabalho porque também é mané.
Se tem alguém se dando bem na esperteza, tem alguém sendo passado para trás. Veja o caso do reiterado conflito histórico entre Israel e o Hamas. Por mais que existam teorias de que o Hamas iniciou o conflito para forçar Israel a gastar seu poder de fogo e se queimar diante do mundo, o povo rico não é bobo: vai acuar e ganhar mais território em cima dos palestinos. O que o esperto do Israel esquece é que a mobilização mundial pela criação do Estado Palestino cresce a cada conflito.
Mais espertos ainda são os argentinos, que ganharam a Copa e agora podem ganhar da ideologia de ultradireita elegendo um presidente da ultradireita. Boa, hermanos! Agora vão ganhar em dólar o que era pago em peso, não é? Alguns disseram que foi essa a promessa. Senta lá, mané, e espera.
Faz lembrar os paralelos que o Plano Cavalo e o Plano Real tiveram em alguns pontos. Só que o Cavalo insistiu, esperto que era, em ficar pareado ao dólar. Isso lá na década de 1990! Até hoje, mesmo tendo um papa argentino, ainda não aconteceu milagre econômico por lá. O Brasil olhou para o vizinho e aprendeu que não poderia ser assim. Fernando Henrique até segurou um poucos os valores na época da reeleição e logo depois o Brasil entrou em crise, teve até moratória do Itamar. Aos poucos se recuperou e alçou altos voos.
Foi derrubado lá do alto, ou nem de tão alto, porque havia uma crise econômica se acercando do Brasil, agravada com o golpe em 2016, mais ainda com a eleição de Bolsonaro em 2018. O que talvez possa salvar os argentinos é um congresso nem tão favorável ao Milei, mas isso retarda o processo, não impede que o esperto seja feito de mané, como aconteceu por aqui antes.
Tudo isso segue assim mesmo, em processo. A educação é um processo, no trânsito ou na política, como a construção de uma imagem é também um processo. O caso Taylor Swift é um exemplo de marca interessante. A Taylor Swift, convém explicar ao leitor menos ligado nas modas musicais, é uma cantora pop que conta histórias com suas músicas, criando referências e cruzamentos em suas narrativas que percorrem mais de um disco.
Ela veio (está) no Brasil para fazer shows, cancelar em cima da hora e ser defendida por parte do fandom diante da morte de uma menina devido ao calor exacerbado num show no Engenhão, Rio de Janeiro. Ela não matou a menina, que provavelmente morreu, segundo a medicina, por desidratação. A causa moral foi esperteza.
Algum esperto, entre outras ações geniais, proibiu a entrada no estádio com água, para que os abastados espectadores do show, que pagaram centenas de reais pelo ingresso e ainda tiveram que providenciar transporte e hospedagem, comprassem seus copinhos por R$10. O que é a vida de uma menina perto de milhares de copinhos vendidos a R$10? E dizem alguns fãs manés que a ídola fez uma homenagem à menina, cantando uma música para ela. Sem sequer dizer “a menina”, quiçá o nome da estudante Ana Clara Benevides.
No mesmo estádio, anos atrás, Roger Waters apresentou seu inquestionável The Wall. Percorrendo a fila de entrada tinha um vendedor gritando “Olha o Roger WATER!!!” Outro nível de artista, tanto o do palco quanto o que vendia água, que não era esperto, era malandro. Tirou vantagem da situação e não passou ninguém para trás. Malandro é malandro, mané é mané. O esperto pode virar mané, já o malandro não cai nem escorrega, não dorme nem cochila, não carrega embrulho e também não entra em fila, nas sábias palavras de Bezerra da Silva.