Agon é a raiz etimológica dos conflitos. Na Grécia Antiga, todo conflito de interesses era agonístico. Fosse um combate de forças ou um enfrentamento retórico, lá estava o agon. Se tem teatro, tem agon, porque, se tudo fica bom e sem conflito, ninguém vai querer ver a peça. É a raiz da tragédia, da comédia, do drama.
O enfrentamento, que não tem nada de novo, em Gaza traz um tanto de tragédia no conflito. A tragédia implica, segundo teóricos do teatro, o fim de um povo. É esse o destino dos palestinos diante do poderio bélico de Israel. Poderio financeiro, vale dizer, porque é mais um conflito do capital em que o poder de fogo precisa ser comprado.
Poder político, porque, numa votação de cessar fogo na ONU, apenas os EEUU (apoiadores de Israel), que acusaram a proposta do governo brasileiro de anti-democrática e a vetaram sozinhos, estavam contra. Enquanto nada se decide, a porradaria continua, hospitais e ambulâncias são bombardeados, vizinhos abrem as fronteiras quando dá vontade (como o Egito, que poderia ter ajudado antes), trabalhadores são numerados e/ou expulsos e crianças vão morrendo porque não souberam educar os mais velhos.
Esse enfrentamento vai mudando de cara com o tempo, mas não tem nada de novo, como acontece quando um time brasileiro enfrenta um estrangeiro na Libertadores. Chegou a vez de o Fluminense jogar sozinho contra o Brasil, mesmo que o Brasil seja representado pelo Boca Juniors. Falar de Brasil é exagero, mas há torcedores brasileiros, e não são poucos, que preferem ver um vizinho ganhar a ter o Fluminense campeão do certame.
Para agravar, os torcedores-raiz dos times, aqueles que são Fluminense em todos os jogos do clube e que são Boca idem, resolvem se ofender (não se provocar, é diferente) pelas redes sociais e se agredir quando se esbarram na véspera do jogo. Que vença o melhor em campo (às vezes é o juiz), e que fora dele cada um entenda que o prêmio do campeonato vai para quem administra a equipe vencedora.
Fica parecendo um constante enfrentamento que existe no jornalismo e nas relações trabalhistas, que não tem nada de novo mesmo quando acontece na redação da Piauí e no já extinto Foro de Teresina. O podcast, referência sobre assuntos políticos para milhares de pessoas no país, despediu-se esta semana. A revista de onde nasceu segue editada, mas a briga repercutiu.
De um lado, o estopim: demissão da jornalista Thais Bilenky, que descumpriu um arranjo “que deveria ser provisório” (como consta no texto do diretor de redação, André Petry) ao se deslocar para São Paulo em 2021. O arranjo era de ser mãe, o que o ex-chefe não expõe no texto, como “questões de natureza interna da revista”, também poupadas para “preservar a privacidade de seus profissionais”. Sem misoginia nesses preservares.
Do outro lado, o desdobramento: José Roberto Toledo lamentou ter tido sua fala cortada depois da despedida de Thais no Foro, alegando censura, ao que Petry disse não se tratar de um texto discutido na redação. Fernando de Barros e Silva, na curta despedida de 7 minutos do podcast, falou que João Moreira Salles, idealizador do projeto, sempre fazia críticas ao programa, mas depois de ser gravado e publicado.
A relação patrão e empregado é agonística, como é a de legitimidade religiosa pela posse da faixa de Gaza ou o embate entre dois times de futebol. Exceto no encontro entre Fluminense e Boca Juniors — um vindo e outro, conforme o resultado das eleições, indo para um buraco econômico e político —, os outros conflitos têm relações de poder que passam diretamente pelo dinheiro e pela retórica.
Associações simbólicas são armas fortes no agon retórico. O conflito entre Israel e Palestinos faz uso histórico desses símbolos. É uma imagem em meio a tantas dos 17 anos da revista, mas que ganha força em função do embate interno: quando a capa da Piauí mostra as crianças dos dois lados vendo os foguetes voando como se tivessem o mesmo olhar, sabe-se quem agoniza.