A vida dos outros

Governo publica sentença que reconhece omissão no caso de Gabriel Pimenta

Gabriel durante assembleia de fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabá (Foto: Arquivo pessoal/Rafael Pimenta)

Como parte do cumprimento da sentença proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos que reconheceu a omissão do governo brasileiro ao não investigar a morte do ativista e advogado juiz-forano Gabriel Sales Pimenta, o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, publicou na edição dessa terça-feira (30) do Diário Oficial da União uma portaria com o resumo oficial do julgamento. Gabriel defendia os trabalhadores rurais em litígios contra fazendeiros quando foi assassinado no dia 18 de julho de 1982 em Marabá, no sudeste do Pará.

Três acusados foram indiciados pela polícia e denunciados pelo Ministério Público por homicídio qualificado. O julgamento se arrastou por duas décadas. Nenhum deles chegou a ser levado a júri popular. Nenhum deles cumpriu pena. O caso só foi levado a julgamento em 2006, mas a ausência de testemunhas e dos suspeitos gerou a extinção da pena. Em 2016, o governo do Pará também negou indenização à família de Gabriel e, em 2021, o Superior Tribunal de Justiça negou o último recurso no Brasil.

No ano passado, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o estado brasileiro pela omissão em proteger os defensores dos direitos humanos, bem como investigar casos de violência contra eles, ao analisar o caso de Gabriel Pimenta. A sentença é um marco histórico após 40 anos de impunidade. Os juízes entenderam que houve uma “grave falência” do estado brasileiro nas investigações sobre a morte violenta de Gabriel Pimenta “pela situação de absoluta impunidade em que se encontra o homicídio na atualidade”.

A sentença ainda considerou que o Brasil “não cumpriu sua obrigação de atuar com a devida diligência reforçada na investigação do homicídio”. A grave negligência dos operadores judiciais na tramitação do processo penal, que permitiu a ocorrência da prescrição, foi o fator determinante para que o caso permanecesse em uma situação de absoluta impunidade. “As autoridades não agiram com a devida diligência ou dentro de um prazo razoável”.

Em razão de tantas violações, Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou as seguintes medidas de reparação (íntegra da sentença aqui):

(1) criar um grupo de trabalho com a finalidade de identificar as causas e circunstâncias geradoras da impunidade e elaborar linhas de ação que permitam superá-las;

(2) publicar o resumo oficial da Sentença no Diário Oficial da União, no Diário Oficial do Estado do Pará e em um jornal de grande circulação nacional, assim como a Sentença, na íntegra, no sítio web do Governo Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário do Estado do Pará;

(3) realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional em relação com os fatos do presente caso;

(4) criar um espaço público de memória na cidade de Belo Horizonte, no qual seja valorizado, protegido e resguardado o ativismo das pessoas defensoras de direitos humanos no Brasil, entre eles o de Gabriel Sales Pimenta;

(5) criar e implementar um protocolo para a investigação dos delitos cometidos contra pessoas defensoras de direitos humanos;

(6) revisar e adequar seus mecanismos existentes, em particular o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas, nos âmbitos federal e estadual, para que seja previsto e regulamentado através de uma lei ordinária e tenha em consideração os riscos inerentes à atividade de defesa dos direitos humanos;

(7) pagar as quantias fixadas na sentença a título de dano material, imaterial, custas e gastos.